Deve a mulher ser submissa?

Hoje se você fala em submissão, grande parte da população já pega pedras na mãos para jogar contra você. Se passar alguém e indagar o porquê do apedrejamento, responderão: “ele é um machista”. Eis uma descontribuição do feminismo. Este movimento confundiu propositadamente submissão com opressão, quando na verdade seu significado, além de mais profundo, é o oposto.

É assim que começa o texto que me motivou a escrever sobre isso. E pretendo começar meu texto da mesma forma como ele começou o dele, exigindo que você largue seus preconceitos. Imagino, também que você só irá continuar a ler esse texto se já tiver lido aquele, então leia lá, para eu não precisar me repetir o texto inteiro.

Pois bem, qual é o problema nessa visão, afinal? O problema são premissas ocultas que antecedem a submissão. Aceitando-as como verdade, realmente é fato que a submissão não se trata de uma forma de oprimir, mas de proteger o lado mais frágil. As premissas que quero discutir aqui são duas. A primeira é a do questionamento de porque seria o homem incumbido de ser superior à mulher. A segunda é se a hierarquia se faz realmente necessária.

No primeiro caso, cito o texto do Alcorão, que explica essa noção, por inteira, com perfeição:

Os homens são os protetores das mulheres, porque Deus dotou uns com mais (força) do que as outras, e pelo o seu sustento do seu pecúlio.

Duas coisas importantes a se retirar dai. A primeira, a favor do argumento da submissão, é que se trata de uma mera questão hierárquica, com o objetivo de organizar o núcleo, sem se tratar, de fato, de um controle absoluto. É necessário não confundir a mera submissão com uma total escravidão. No primeiro caso, aquele que é hierarquicamente inferior tem sua capacidade de ação limitada, mas não inexistente. Ou como dito em efésios 5: “Sujeitem-se uns aos outros, por temor a Cristo”.

Por outro lado, o que está nas entrelinhas e que não pode ser ignorado é que nunca se falou em menor capacidade intelectual. Assim, a razão para o homem ser superior e protetor à mulher decorre, meramente, de sua força e capacidade física superior. Ora, fica notório que tal não é mais a condição atual da sociedade, pois frente as atuais armas, a força, por si, não diferencia mais um homem de uma mulher no quesito da proteção. A criação da arma de fogo igualou a capacidade de defesa e de ataque de ambos os sexos. Em comparação à uma mulher com uma G21, uma pistola que apesar de pesar um 1kg quando carregada, utiliza munição .45, a força superior do homem nada é capaz. A condição pela qual se justifica a submissão deixou de existir a algum tempo. Com a criação das armas de fogo, hoje em dia cada vez mais leves ao ponto de crianças usarem fuzis durante as guerras civis na África, não existe mais o que falar em proteção da mulher ou sexo frágil.

E isso também se estende à manutenção da família. O homem é superior à mulher em capacidade física, a mulher é superior ao homem em convencimento e diplomacia. Na sociedade capitalista, pelo próprio desenvolvimento tecnológico e pela complexidade das relações sociais, criou-se inúmeras demandas distintas, de forma que a mulher como meramente dona de casa acabou por desaparecer com o tempo, pois existem sim lacunas para elas no mercado de trabalho. Isso claro, considerando o ser humano comum. No fim, é toda essa questão bem mais complexa porque cada indivíduo tem suas características e um casal, pode, muito bem, se igualar em capacidade física e produtiva. É possível, até mesmo, a total inversão do signo. Se a mulher é mais forte que o homem, deve a mulher escolher outro indivíduo sendo aquele necessariamente indigno de tê-la como esposa ou inverter as funções? Como pode essa regra funcionar na sociedade atual?

Outra questão: É a hierarquia condição sine qua non para a construção do núcleo familiar? Cada um com seu conjunto de valores, mas imagino que seja de comum acordo a necessidade dos relacionamentos serem gerados pelos desejos dos indivíduos, sem nenhum tipo de coerção. Assim, diferente da hierarquia estática do protetor e da protegida, se cria a relação dinâmica onde a atividade e a passividade dependem do contexto e cabe àquele que esteja melhor preparado para a situação, assumir.

Esse caso é o que existe hoje: Um acordo de vontades onde cada um sacrifica parte de suas liberdades em prol do outro e da união. Facultativo, sem uma hierarquia clara, onde inexiste, de tal forma, a submissão, pois é na verdade um complementando o outro, tendo cada um uma função definida e não conflitante, sem exatamente um dando ordens. Se tratariam de meras sugestões.

Eu uso-a (submissão) no sentido etimológico de ser alguém abaixo, ou debaixo, fornecendo apoio tal como uma coluna apoia o telhado visto que nós, como mulheres, somos mais fortes. Nós somos capazes de colocar a personalidade na relação. João Paulo II escreveu que a mulher tem o gênio e o talento do relacionamento, e como tal, nós somos capazes de ser o coração da família. A submissão é uma coisa muito, mas muito boa para a mulher.

Porque deve, a mulher, ser a coluna? Porque não pode ser um trabalho em equipe, onde quando um dá suporte, o outro faz o que deve, sendo tais características intercambiáveis na medida da necessidade, ou até mesmo o oposto? Se o homem, por ter um emprego que pode ser exercido em casa, toma para si a tarefa do cuidado do lar enquanto a mulher ganha a maior parte do salário num emprego melhor, qual o problema? Será que é o homem verdadeiramente incapaz de criar um filho? Somos tão insensíveis e bárbaros ao ponto de não podermos cuidar de nossa prole? Onde está a tal superioridade do homem nesse caso? Homens não tem o coração e a mulheres não tem cérebro? Simplesmente não faz sentido assumir que esse caso se aplique à todos os casais do planeta.

A comparação com o fórum da internet também é errônea, porque existe um motivo para os administradores terem essa hierarquia: Graças aos custos associados, seja em dinheiro de hospedagem ou trabalho, o administrador é, senão dono, alguém que age em nome do dono, enquanto os membros são meros usuários usufruindo de um serviço. Se a comparação fosse a de um grupo de alunos que escolhe um líder da turma, mas pode tirá-lo quando quiser, se trata de uma comparação mais correta. E perceba, não existe uma hierarquia de fato, mas somente uma mera delegação de poder com fins administrativos.

Esse caso de um indivíduo investindo sozinho não é o caso da sociedade atual, nunca foi aliás, porque sempre foi costume da humanidade, junto com a filha, se entregar o dote que paga a parte dela e deve ser o suficiente para colocar ambos na condição de sócios igualitários. Se trata de dois indivíduos com os mesmos direitos e deveres, sendo, portanto, toda e qualquer hierarquia no leito conjugal, uma apropriação injusta.

A única exceção, para a injustiça na submissão, é se a pessoa se submete de livre e espontânea vontade, sendo lícito que ela saia desse estado quando desejar. Assim a hierarquia é somente formal, pois pode ser desfeita ao bel prazer da parte submissa. Não existe uma apropriação, mas uma concessão maior por uma parte, concessão essa que pode ser unilateralmente revogada, sob risco de destruir o matrimônio caso o outro se negue a devolver o que é legítimo (e conseguinte destruição do núcleo familiar, que acaba com o objeto em questão). Nesse caso, não existe o que se falar em submissão ou hierarquia de fato, porque é meramente a forma de se organizar que aquele casal encontrou. Forma essa total e completamente consensual e facilmente modificável que agrada a ambos. Esse tipo de submissão, que imagino que foi o que ele quis dizer, não é uma opção ao livre acordo, mas uma de suas possibilidades.

No caso explicado no texto, deve ele excluir por completo o conceito de hierarquia ou de consensualidade. Uma coisa que preciso explicitar antes de continuar é que nem toda opressão é danosa ou ilegítima, mas se faz mister entender que oprimir aquele que está em condição inferior quando se faz necessário é a única razão pela qual existe a hierarquia. Não estou aqui dizendo que é tudo nesse universo é opressão, como fazem os defensores da teologia da libertação ou as feministas, mas o fato é que, usar ativamente um poder sobre outra pessoa de forma a lhe negar algum direito, seja ele qual for, é uma opressão.

Se a hierarquia é produzida por um acordo de vontades irrevogável, como era o casamento antes do divórcio, não existe o que se falar em uma repressão injusta ou ilegítima, mas é sim uma forma de opressão. Ora, isso não é incomum e nem mesmo abominável. Em aspectos mais simples, como um penhor, a ferramenta de opressão ao descumprimento de suas obrigações é lícita. Se na proteção do patrimônio isso é válido, não questiono se seria inválida a opressão para a proteção do núcleo familiar, mas isso é secundário porque independente disso tudo, continua sendo uma opressão.

A pergunta que deve ser feita não é se a submissão é uma forma válida de construir a família. A sociedade chegar ao ponto que chegou prova que funciona, a questão, que merece reflexão, é se essa é a única forma. Quando o autor fala, no trecho “de modo análogo deve ser a relação entre um homem e uma mulher”, a palavra “deve” é muito forte. Mesmo entendimento quando clama que “somente ideologias desonestas e depravadas” podem distorcer esse que é “o segredo para a felicidade do lar”.

Me perdoe o autor, mas alegar que esse é o segredo para a felicidade do lar é tentar simplificar algo por demais complexo, pois só isso não é o suficiente e essa não é a única forma de alcançar a felicidade no lar. “Ideologia desonesta e despravada” é aquela que tenta distorcer as palavras ao ponto de criar a bola quadrada que é a hierarquia consensual. Tão desonesta quanto o feminismo que diz que toda opressão é necessariamente ruim.

2 comentários

  1. Concordo inteiramente e não vejo como um casamento pode dar certo com hierarquia, um submisso, sub- que dizer abaixo e o outro por cima, sempre decidindo e subjugando, pois o ser humano é falho e quando se sente revestido de autoridade tem o vício de querer fazer valer sempre a sua vontade. Acho que a submissão acaba, isso sim, com os casamentos, tenho uma conhecida que vive um casamento assim e este está falido, ela fala com desprezo do marido, somente o suporta e não sei até quando. Os pregadores devem pregar companheirismo, troca, amor, harmonia e não mulher debaixo de pés de homem, eu sou cristã mas falo para quem quiser ouvir não sou submissa e não tenho chefe, tenho um companheiro, com o qual em comum acordo dirigimos nosso lar.

    1. Acho bizarra a ideia de alguém acreditar que exerce alguma autoridade sobre outra pessoa por permissão divina. Gostei muito do seu comentário e fico feliz em ver que existem mais pessoas que concordam comigo.

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